Acordo União Europeia – Mercosul é julgado no Tribunal Popular O Imperialismo no Banco dos Réus, no Rio de Janeiro

Crédito da foto: Divulgação MST A Amigas da Terra Brasil esteve presente no Tribunal Popular O Imperialismo no Banco dos Réus, que aconteceu em 15 de novembro no Rio de Janeiro, no Brasil, com a participação de diversas organizações e movimentos sociais da América Latina e do mundo. A atividade antecedeu a Cúpula do G20, fórum de cooperação econômica internacional entre os países, que, até então, estava sendo presidido pelo Brasil. Integramos a articulação regional ATALC (Amigos da Terra América Latina e Caribe), apoiando a Jornada Continental contra o Neoliberalismo em Defesa da Democracia na construção do Tribunal Popular. Também contribuímos na formulação do caso apresentado no eixo indução à pobreza, que tratou de políticas de austeridade e Tratados de Livre Comércio, com análise dos Tratados do Mercosul e União Europeia, mencionando os exemplos de Sri Lanka, Paquistão, Brasil e Argentina. A Amigas da Terra Brasil faz parte da Frente Brasileira Contra os Acordos Mercosul-União Europeia e EFTA pela qual, com mais de 100 outras organizações sociais do país, lutamos para que esses acordos não sejam assinados nos atuais termos propostos. No vídeo abaixo, a conselheira da Amigas da Terra Brasil, Lúcia Ortiz, relata o que foi o Tribunal Popular. Toda essa mobilização popular no Rio de Janeiro ajudou para que o G20, que se reuniu logo após, nos dias 18 e 19 de novembro, não avançasse com as tratativas do Acordo União Europeia – Mercosul, mesmo com a pressão dos líderes dos blocos europeus. “Ainda que exista essa pressão para fechar o acordo ainda neste ano, as condições ainda não estão dadas para que se chegue a esse termo. O fato de não ter acontecido esse anúncio no dia 20 de novembro, por si só já é uma vitória”, defendeu Lúcia. Nesta semana, de 26 a 29 de novembro, acontece a Cúpula do Mercosul, em que os governos retomam as negociações do Acordo UE-Mercosul. “Vamos seguir na luta para enterrar esse acordo de vez”, completa Lúcia. Reproduzimos, abaixo, a sentença final do Tribunal Popular: o imperialismo no banco dos réus, lida pela juíza Simone Dalila Nacif Lopes: SENTENÇA Quatro são os casos submetidos ao “Tribunal Popular: o imperialismo no banco dos réus”, a saber: Genocídio dos povos: tendo por caso-modelo a Palestina e sendo apresentados para contextualização fatos ocorridos no Líbano, Iemen e Sudão. Indução à pobreza: políticas de austeridade e Tratados de Livre Comércio, com análise dos Tratados do Mercosul e União Europeia, mencionando os exemplos de Sri Lanka, Paquistão, Brasil e Argentina. Guerra econômica: violação da soberania e da autodeterminação dos povos, tomando-se por paradigma os casos de Cuba e Haiti e sendo mencionada a Venezuela. Racismo estrutural e ambiental: cujos casos-referências foram o extermínio da juventude negra do Rio de Janeiro e os crimes de Mariana/MG, com menção a Ayotzinapa (México), Haiti, Colômbia, reparações coloniais, Mapuches (Chile e Argentina), Povo Avá Guarani, Bhopal, Honduras, Incêndios no Brasil, Braskem, Chevron / Equador, reparações ao sul global, transição energética. O libelo acusatório foi apresentado por Sr. Dayron Roque Lazo – Centro Martin Luther King, Cuba e pela Sra Sandra Quintela – Jubileu Sul. O Sr. Tom Kucharz, da Espanha, atuou como advogado de defesa do Imperialismo e o Dr. Alexandre Ferreira Guedes – Associação Brasileira de Juristas pela Democracia, Brasil – produziu a prova da acusação. Foram ouvidas as testemunhas Rula Shaheed (Palestina), Morgan Ody (Confederación Paysanne / França e Via Campesina), Raiara Pires (Movimento pela Soberania Popular na Mineração/ MAM e Frente Brasileira contra o Acordo Mercosul – UE), Aleida Guevara (Cuba), Henry Boisrolin (PAPDA / Haiti), Marcelo Dias (Movimento Negro Unificado- Brasil) e Vanilda Aparecida de Castro Souza, da Bacia do Rio Doce e do Movimento Atingidos por Barragem. Garantido o contraditório e a ampla defesa com iguais oportunidades de pergunta tanto para a defesa como para a acusação, encerrada a instrução, as partes apresentaram suas Alegações Finais. O Conselho de Sentença foi composto por Yildiz Temürtürkan, da Turquia (Coordenadora Internacional da Marcha Mundial de Mulheres) – presidenta do Júri, Ousmane Lankoandé Miphal / Burkina Faso (Secretario Geral da organização Balai Citoyen), Lana Vielma Membra da Comuna Maizale da Unión Comunera / Venezuela, Maria Juliana Rivera Vera Representante do Congreso de los Pueblos / Colombia, Beverly Keene / Argentina Coordenadora da organização Diálogo 2000 e do Jubileu Sul – Américas, João Batista – Movimento Negro Unificado / Brasil, Sra. Monica Gurjão Quintão – União dos Negros pela Igualdade – UNEGRO, Após reunir-se para deliberação, os jurados chegaram a uma decisão e a Presidenta do Júri, Yildiz Temürtürkan, declarou o veredito: à unanimidade, os jurados CONDENARAM o Imperialismo pelos crimes de Genocídio dos povos (Palestina), de indução à pobreza através de políticas de austeridade e Tratados de Livre Comércio (Mercosul e União Europeia), de guerra econômica com violação da soberania e da autodeterminação dos povos (Cuba e Haiti), e de racismo estrutural e ambiental (no Brasil contra a juventude negra do Rio de Janeiro e contra o meio-ambiente pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana/MG). É O RELATÓRIO. DECIDO. Ao final do julgamento, a pretensão acusatória restou fartamente comprovada, conforme decidido pelo Conselho de Sentença. Com efeito, no caso do Genocídio dos Povos, a prova dos autos revela que o povo de toda a Palestina, e particularmente de Gaza, vem sendo submetido ao colonialismo há 76 anos e está sofrendo genocídio há 409 dias abertamente praticado pelo Estado de Israel com a cumplicidade dos Estados Unidos, da Alemanha, do Reino Unido e de outros países europeus e ocidentais. Como vem sendo televisionado para todo o mundo, Israel bombardeia e ataca casas, hospitais, universidades e escolas, assim como abrigos e prédios da ONU, tendo demolido e danificado 66% da infraestrutura de Gaza promovendo uma destruição em massa. É negado o acesso a água, a alimentos, a combustível, à ajuda humanitária e a necessidades básicas, o sistema de saúde colapsou e o deslocamento forçado sujeitaram a população de Gaza à fome forçada e criaram condições propícias para epidemias. Desde outubro de 2023, Israel, em sua
Musk e X não estão acima de todos: a impunidade das big techs

Nos últimos meses, acompanhamos o duelo de poder entre Elon Musk e o STF (Supremo Tribunal Federal). O empresário, dono de uma das maiores plataformas de big tech do mundo, a X, decidiu ter uma queda de braço com o Ministro Alexandre de Moraes, chegando inclusive a suspender o serviços da plataforma no Brasil. Longe de ser apenas uma batalha de egos, o caso expõe os riscos democráticos da concentração de poder nas mãos das empresas transnacionais. Articulação internacional de organizações e movimentos sociais tenta, há 10 anos, criar um Tratado Vinculante junto à ONU para responsabilizar as empresas transnacionais. Crédito: Reprodução/Dismantle Corp Power De acordo com pesquisas desenvolvidas pelo Center for Countering Digital Hate, a plataforma X tem sido o epicentro da desinformação. Recentemente, durante as eleições nos EUA (Estados Unidos), as postagens de Elon Musk têm atingido milhões de seguidores, influenciando nos resultados eleitorais. Da mesma forma, pesquisas apontam a relação entre o comportamento extremista de Musk e as manifestações fascistas na Inglaterra. As empresas transnacionais vêm concentrando poder político, econômico, social e cultural desde os anos 70. Possuem uma capacidade de adaptação às críticas sociais e ambientais, transformando-se cada vez mais em entes para além do Estado. Um marco regulatório internacional para essas pessoas jurídicas internacionais, que produzem em cadeias globais de valor, que especulam em mercados financeiros internacionalmente, não avança, de modo que se propaga a arquitetura da impunidade. As big techs, como são conhecidas as empresas transnacionais da tecnologia, entre elas o X, Google, Meta e Amazon, movem um capital financeiro maior que o PIB (Produto Interno Bruto) de toda a América Latina; em número, são cerca de R$ 10 trilhões. O Google vem conseguindo implementar o monopólio da pesquisa online, sendo uma das plataformas de busca mais utilizadas em todo o mundo. A Meta, que além do controle de grandes redes sociais como Facebook, agora domina o WhatsApp, acumula uma base de dados e de informações de seus usuários maior que os mecanismos de vigilância estatais. Com esse capital econômico, político e cultural, as big techs estão determinando que tipo de pensamento hegemônico reproduzir sobre a consciência das massas. Na América Latina, os efeitos eleitorais do uso dessas máquinas são desastrosos. Na Argentina, o papel que a plataforma X teve em influenciar a juventude com ideologias extremistas rendeu a vitória eleitoral a Javier Milei. Ou mesmo o papel que a Meta vem tendo para uso do Messenger do Facebook no atendimento de políticas de saúde e proteção para mulheres grávidas. Estamos sendo vítimas de um novo tipo de colonialismo modernizante. As iniciativas de regulação, sobretudo da inteligência artificial, ainda patinam, e nem enfrentam o tema sobre a perspectiva da ameaça à soberania. No Brasil, projetos de lei como o PL das Fake News (n.º 2630/2020) estão completamente paralisados no Senado. Recentemente, o Ministério da Fazenda anunciou que apresentou um plano para regulação, visando um equilíbrio de mercado junto ao CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). De uma forma geral, projetos regulatórios, como as diretrizes da União Europeia, seguem apostando na boa vontade empresarial em autorregular-se. Iniciativas que se contrapõe à impunidade Desde 2014, tramita no Conselho de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas), a formulação de um Tratado Vinculante sobre Empresas Transnacionais e Direitos Humanos, no qual se possa corrigir a assimetria de poderes entre empresas transnacionais e atingidos, possibilitando pôr fim a uma arquitetura da impunidade corporativa internacional. Ocorre que, ano após ano, o projeto vai sendo desidratado pela correlação de forças conservadoras no Conselho. Recentemente, o governo do Equador, país que está na Presidência do Grupo responsável pela elaboração do instrumento, sem qualquer diálogo, cancelou a sessão prevista para meados de outubro, apresentando final de dezembro como nova data para a agenda. A manobra causou insatisfação popular. Mais de 300 milhões de pessoas da sociedade civil, movimentos sociais e centros de investigação reunidos na Campanha Internacional pelo Desmantelamento do Poder Corporativo e pela Soberania dos Povos lançaram um manifesto. No documento, apontam que o reagendamento favorece a participação de países do Norte Global em detrimento de países do Sul global, prejudicando, ainda, a participação de organizações e movimentos que já tinham comprometido seus orçamentos com passagens e hospedagens caras em Genebra, na Suíça, para as datas de outubro. No Brasil, o projeto de lei n.º 572/2022, que propõe uma lei marco sobre direitos humanos e empresas, encontra-se parado na Câmara dos Deputados desde outubro de 2023. Democratização dos meios de comunicação Não existe democracia na comunicação realizada pelas big techs nas redes sociais. Os usuários dessas redes estão expostos a todo tipo de conteúdo misógino, racista, homofóbico, elitista, diariamente. Essas empresas não têm nenhum compromisso ético com as informações compartilhadas, ou mesmo mecanismos eficazes de remoção de conteúdos que remetem à violência, violação de direitos humanos e desinformação. Sequer, os consumidores desses veículos têm proteção contra o uso de seus dados pessoais. Talvez, de todos os medos que possamos ter sobre um futuro do planeta dominado pelas empresas transnacionais, o controle das formas de pensar e a produção de hegemonia por estas big techs seja uma das maiores ameaças a qualquer projeto de futuro alternativo que possamos construir. Precisamos urgentemente nos libertar desse controle. Supõe-se que o que diferencia nós, humanos, de outras espécies, seja a nossa capacidade de raciocinar. Certamente, uma habilitante em xeque diante do cenário de desinformação. Assim, para além da urgência de regulação das empresas transnacionais, sobretudo as big techs, em prol da defesa dos valores democráticos, talvez o mundo requeira um pouco mais de inteligência, racionalidade e humanidade às pessoas. Fica o convite para pensar para além dos 280 caracteres. **Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato. Edição: Nathallia Fonseca * Artigo da ATBR publicado originalmente no site do jornal Brasil de Fato em 22/11/2024. Acesse neste link: https://www.brasildefato.com.br/2024/11/22/musk-e-x-nao-estao-acima-de-todos-a-impunidade-das-big-techs